Vacas e gafanhotos
Eles estavam
reunidos na mesa do jantar. A mãe fazia questão disso, apesar da dificuldade em
se conseguir os alimentos para a última refeição do dia. Esse era seu ritual do
início da noite e ninguém ousava questionar, nem mesmo o pai.
Em silêncio,
todos aguardaram que ela servisse a cada um sua porção, que era milimetricamente
calculada. Numa ponta da mesa sentava-se o avô; na outra sentava-se o pai, como
era o costume naquela família. Os filhos homens sentavam-se nas cadeiras
laterais, à direita do pai. A mãe e a filha sentavam-se do lado esquerdo.
Ninguém sabia o motivo desse arranjo, mas nada era contestado, de modo que se
tinha a impressão que ele existia desde sempre, ou desde que a avó ainda era
viva.
Ainda em pé,
a mãe retira a comida da panela com uma concha e serve um por um, até chegar no
avô, que olha fixo a grande televisão que ocupa toda a parede oposta da sala de
jantar. Depois que ela se afasta, o velho finalmente olha o prato.