O Trem Fantasma
Os três garotos olharam a boca do túnel escura e misteriosa com
sentimentos diferentes. Exceto pelo gordo, que se mostrava claramente
assustado, os outros estavam à vontade naquele lugar desolado. Na verdade,
estavam se divertindo com o medo dele e se preparavam para lhe dar o maior
susto de sua vida.
- Isso parece perigoso. – Disse
o garoto gordo, com voz esganiçada.
- Vai “amarelar” agora? – Disse
o magro alto, em tom de desafio.
O gordo engoliu em seco. Não
queria passar por covarde, mas não precisava de muita imaginação para achar que
aquela boca de túnel escura estava apenas aguardando que se aproximassem para
mostrar seus enormes dentes e devorá-los.
O garoto ruivo e sardento que,
até então, mantinha-se calado, interferiu.
- Quem sabe a gente não vem de
manhã. – Disse ele, com pena do Gordo.
Na verdade, ele já estava
achando aquela incursão noturna pelo parque de diversões abandonado uma ideia
estúpida. Não tinha medo de fantasmas, mas quem poderia saber o que se escondia
na escuridão daquele túnel? Aquele lugar era sombrio e assustador o suficiente
para ocultar algum tipo de escória que poderia considerá-los intrusos em seu
território. Isso poderia ser bem mais perigoso que um susto naquele gordinho
covarde. O pobre coitado queria apenas fazer amigos, mas eles viram nisso uma
oportunidade para se divertir e inventaram um rito de iniciação para ele. O
plano era simples: fazê-lo percorrer o túnel do trem fantasma daquele parque à
noite. Durante a travessia, um deles se esconderia para assustar o gordo.
- Voltar amanhã parece uma boa
ideia. – Disse o gordo, fazendo menção de voltar por onde tinha vindo.
- Vir aqui durante o dia? –
Perguntou o garoto magro e alto, com desdém, segurando-o pela gola da camisa. –
Isso não teria a menor graça. Agora que estamos aqui, vamos até o fim.
O Garoto ruivo e sardento ia
dizer algo, mas desistiu. Ele não queria ser considerado covarde junto com o
gordo.
O magro alto olhou para o gordo
sem compaixão. Não gostava de covardes e tinha uma repulsa especial por garotos
de aspecto efeminados, como aquele gordinho de fala macia e hesitante. Apesar
disso, condescendeu um pouco. Aquela noite e o local eram perfeitos para assustar
e ele não queria correr o risco de ver sua vítima correr antes do tempo.
- Vamos todos juntos, então.
Está bom assim? – Ele perguntou, ainda segurando o gordo pela gola da camisa.
- Acho que sim. – Respondeu o
garoto gordo, sem coragem para dizer que preferia ir embora dali o mais rápido
possível.
Os três entraram no túnel e
foram envolvidos pela escuridão. O garoto gordo olhou para trás e viu a entrada
do túnel cada vez menor, como se estivesse se fechando. Ele fez um esforço para
acreditar que era apenas uma impressão, em razão do afastamento deles. Todavia,
a escuridão se tornou quase total alguns passos depois.
- Não vejo mais a boca do
túnel. – Disse o garoto ruivo e sardento, com voz trêmula. Ele já não se
importava muito em parecer um covarde.
- É porque o túnel faz uma
curva, bobalhão.
O gordo começou a transpirar e
sentiu que seu coração iria sair pela boca a qualquer momento. Já não conseguia
enxergar onde estava pisando e maldisse a hora em que ele se envolveu com
aqueles dois malucos.
- Não consigo enxergar. – Disse
ele com voz trêmula.
O garoto magro e alto ligou uma
lanterna e eles perceberam que o túnel tinha se alargado e eles estavam no que
parecia ser uma antiga estação de trem.
- Como é que isso tudo cabe num
parque de diversão? – Ele perguntou, sem compreender.
- Acho que não estamos mais no
parque. – Disse o ruivo.
- Será que estamos em outra
dimensão? – Perguntou o gordo, com a respiração entrecortada.
O magro alto também estava
assustado e se irritou com a voz do gordo, mas um barulho chamou a atenção dele
antes que dissesse qualquer coisa sobre isso.
- Ouviram isso?
- Isso o quê? Não ouvi nada. – Disse o ruivo.
- Nem eu. – Falou o gordo, com
um prazer perverso, ao perceber o medo transparecer na voz do valentão.
- Parece um trem. Não estão
ouvindo?
Aos poucos o ruído se tornou
mais claro e eles ouviram nitidamente o barulho de um trem se aproximando.
Alguns segundos depois, eles podiam ver as luzes da locomotiva no fim do túnel.
- Está vindo para cá. – Disse o
ruivo, com a voz quase sumida.
O barulho aumentou e o trem se
tornou visível para eles. Era uma velha locomotiva do século 19 e estava em
péssimo estado, quase caindo aos pedaços.
- Nossa! Que velharia! – Disse
o gordo, enquanto trem finalmente parava na plataforma em que eles estavam.
Pelas janelas dos vagões de
passageiros, eles viam figuras estranhas que também olhavam para eles.
- Parecem fantasmas. – Disse o
magro alto, já sem nenhum cuidado em disfarçar o pânico.
- Eles são fantasmas, seu
idiota! – Falou o gordo. Já não sentia medo e era sua vez de mostrar-se sem
compaixão.
Se o magro alto percebeu a
mudança de atitude do gordo, nada disse. Estava apavorado demais para isso.
Depois de um momento, que pareceu uma eternidade, eles perceberam que trem
parecia aguardar por eles.
- O que esse trem maluco está
esperando? Perguntou o Magro.
- Ainda não percebeu? Está esperando
que a gente embarque. – Disse o ruivo, mordaz.
- Mas ali só tem morto.
O gordo e o ruivo caíram na
gargalhada.
- Contamos para ele? –
Perguntou o ruivo ainda rindo.
- Não. – Respondeu o gordo,
ainda relembrando a boca do túnel se fechando. – Logo ele vai perceber que esse
túnel não tem nenhuma curva
1 comment:
Um conto curioso... Interessante. Fiquei pensando que afinal, o caçador virou caça...
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